" Agora imagina : estás no último piso do prédio mais alto do mundo e por baixo de ti só uma emboscada de fogo, labaredas a devorarem escadas na tua direcção. Lá fora, se partires os vidros, abre-se o mundo todo num ceu azul, para um precipicio mais fundo do que possas imaginar. Por isso imagina : não se trata de escolher entre a vida e a morte, tens de escolher como vais morrer.
Posso garantir, um ano depois, que ainda só acredito quando revejo os corpos destrambelhados, sacudidos pela ventania das alturas, precipitados num vôo sem regresso.
Olho e penso : estás vivo. Neste momento em que te captaram estavas vivo e sabias que estavas no fim. Posso garantir que não precisava desta brutal prova da nossa pequena mortalidade. Reconheço-a há muito, assalta-me constantemente, sei o que me aguarda, lá no fundo dos anos.
O que me fica é a sensação de estupidez.
Uma carreira dentro das noticias e dos acontecimentos, sem perceber que já nos moviamos há muito no 11 de Stembro. Em cada mulher morta à pedrada por setença de macho, em cada cimeira da terra atropelada pelo dinheiro, em cada discurso de cowboy que procura um novo alvo, em cada Argentina que de um momento para o outro esgravata de fome, em cada fome ininterrupta que rasteja pelas Áfricas e Ásias, em cada miudo morto por overdose, apalpado por um padre, espancado em familia.
Posso garantir, um ano depois, que ainda só acredito quando revejo os corpos destrambelhados, sacudidos pela ventania das alturas, precipitados num vôo sem regresso.
Olho e penso : estás vivo. Neste momento em que te captaram estavas vivo e sabias que estavas no fim. Posso garantir que não precisava desta brutal prova da nossa pequena mortalidade. Reconheço-a há muito, assalta-me constantemente, sei o que me aguarda, lá no fundo dos anos.
O que me fica é a sensação de estupidez.
Uma carreira dentro das noticias e dos acontecimentos, sem perceber que já nos moviamos há muito no 11 de Stembro. Em cada mulher morta à pedrada por setença de macho, em cada cimeira da terra atropelada pelo dinheiro, em cada discurso de cowboy que procura um novo alvo, em cada Argentina que de um momento para o outro esgravata de fome, em cada fome ininterrupta que rasteja pelas Áfricas e Ásias, em cada miudo morto por overdose, apalpado por um padre, espancado em familia.
Se te quiseres lembrar de olhar para a TV, lembra-te de tomar atenção, por exemplo, ao que costumamos chamar conflito israelo-árabe. Lembra-te que está lá desde que te lembras e que muito provavelmente te irá sobreviver.
E faz um esforço para verificar uma lógica contra a qual podes pouco : a melhor maneira de conseguir matar uma dezena ou mais de inimigos é levar uma bomba atada á cintura e abraçá-los num clarão de fogo. Estes homens e mulheres de bombas atadas á cintura, aos comandos de um avião, desafiam as unicas regras que conhecem e , sobretudo, riem-se do teus receios.
O nosso medo alimenta-se do que temos a perder . E contra os que decidem perder a vida para te castigar, podes pouco ou nada. Porque tudo pode acontecer a qualquer momento.
Esta será a lição de pesadelo aos onzes de Setembro.
Esta imensa cobardia mascarada de coragem suprema."
Rodrigo Guedes de Carvalho.
Um ano após o 11 de Setembro